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O manejo de gestantes e o afastamento do trabalho durante a pandemia

Desde que a Organização Mundial da Saúde (OMS) informou a existência de uma pandemia de Covid-19, olhares se voltaram para a população mais propensa a contrair a doença – os chamados grupos de risco –, seja por características próprias do indivíduo, seja por fatores externos a ele.

A princípio, as gestantes não faziam parte do grupo. No entanto, com o passar dos meses e a realização de mais estudos, elas foram incluídas e muitas questões surgiram quanto ao manejo dessas trabalhadoras no ambiente ocupacional.

Para esclarecer as principais dúvidas dos Médicos do Trabalho e profissionais de SST sobre esse assunto e nortear quanto às medidas e ações necessárias, a AMIMT conversou com a Médica do Trabalho Dra. Jaqueline Azan. Confira:

O que diz a legislação sobre o manejo de gestantes?

Com a reforma trabalhista de 2017, durante toda a gestação, a empregada deveria ser afastada de atividades insalubres de grau máximo e mediante atestado do médico de confiança desta, de atividades insalubres de grau médio e mínimo. Isso também deveria ocorrer durante toda a lactação, mas com relatório do médico assistente indicando afastamento de atividades insalubres em qualquer grau.

Após a decisão do Superior Tribunal Federal (STF), o Artigo 394-A ficou com a seguinte redação: “Sem prejuízo de sua remuneração, nesta incluído o valor do adicional de insalubridade, a empregada deverá ser afastada de atividades consideradas insalubres em qualquer grau, durante a gestação e lactação.

§ 3o Quando não for possível que a gestante ou a lactante afastada nos termos do caput deste artigo exerça suas atividades em local salubre na empresa, a hipótese será considerada como gravidez de risco e ensejará a percepção de salário-maternidade, nos termos da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, durante todo o período de afastamento.”

No artigo não é informado como o afastamento deve se dar, ficando a cargo da empresa a análise e a maneira de ser exercido. Com o início da pandemia, essas orientações foram mantidas, mas com novas interpretações, devido ao risco de contaminação pelo ar.

Quais as recomendações quanto àCovid-19?

Segundo a publicação “Recomendações de proteção aos trabalhadores dos serviços de Saúde no atendimento de Covid-19 e outras síndromes gripais”, do Ministério da Saúde, as trabalhadoras gestantes ou lactantes de empresas da área de saúde não devem prestar atendimento e assistência direta a pacientes, devendo ser realocadas de função, em atividades de gestão ou apoio, de forma a minimizar o risco de contato com pessoas ou ambientes contaminados, preferencialmente em trabalho remoto – como teleatendimento.

Os gestores dos serviços de saúde, em conjunto com a Comissão de Controle de Infecção Hospitalar e o SESMT, deverão realizar a avaliação de risco para transmissão da Covid-19 em cada área da empresa, a fim de definir as estratégias de realocação de pessoal dentro do serviço. Se não for possível a realocação, os trabalhadores devem desenvolver suas atividades por meio de trabalho remoto.

No Guia Prático de Gestão em Saúde no Trabalho para Covid-19 do Ministério da Saúde, aquelas cuja gestação seja considerada de risco devem ser encaminhadas para perícia do INSS, após afastamento de 15 dias. As que não se enquadrem neste grupo também devem seguir as orientações acima, ou seja, devem se afastardo risco ou trabalhar remotamente quando possível.

Quais medidas devem ser adotadas por empresas que possuem gestantes no quadro de colaboradores?

Toda gestante deve comunicar imediatamente a gravidez à sua chefia imediata, que a encaminhará ao setor de Medicina do Trabalho para as devidas providências quanto à análise do local de trabalho e possível mudança, com conseqüente retirada de exposição a risco ocupacional. E, dependendo do caso, se a gestação for de risco, a trabalhadora deverá ser encaminhada ao INSS para perícia médica e possível afastamento, quando passará a receber o auxílio-doença até a data do parto quando se transformará em licença maternidade.

E sobre o retorno ao trabalho durante a pandemia? Existe alguma regra ou orientação após o fim da licença maternidade? 

Após o retorno, a funcionária deverá manter-se afastada do risco enquanto durar o período de lactação previsto em lei, que termina quando a criança completa 6 meses de idade.

Após a vacina, esse contexto muda?

Ainda não existe vacina contra o coronavírus com segurança e eficácia avaliadas para gestantes e lactantes, aprovada pela Anvisa e que seja segura o bastante para ser aplicada, pois os estudos realizados não contemplaram este grupo especifico.

Com isso, surgem questões como: para quem vai o ônus? Para a empresa? E se encaminharmos a gestante ao INSS, mesmo sabendo não se tratar de uma gestação de risco, mas de uma gestação normal, que não diminui a capacidade laboral da mulher, o órgão irá assumir o afastamento como benefício? De qual espécie será o benefício, já que não se trata de uma doença e, sim, de uma condição?

São questionamentos que surgem e, infelizmente, seguem sem respostas. É necessário reunir uma equipe multiprofissional, que deve incluir Médicos do Trabalho, profissionais de RH/DP e da área jurídica, além da própria gestante, seu médico assistente e, porque não, o próprio INSS, para que se discuta e conclua,de modo que o trabalho não seja fonte de adoecimento e os direitos de empregados e empregadores sejam observados. 

Informações complementares

A Nota Técnica 01/201 do Ministério Público do Trabalho, que tratada proteção à saúde e igualdade de oportunidades no trabalho para trabalhadoras gestantes em face da segunda onda da pandemia deCovid-19, recomenda às empresas, sindicatos e órgãos da administração pública a adotarem algumas medidas e diretrizes para garantir a proteção de trabalhadoras gestantes:

– Retirar das escalas de trabalho presencial as trabalhadoras gestantes;

– Garantir, sempre que possível, às trabalhadoras gestantes o direito a realizar suas atividades laborais de modo remoto, em home Office, quando for compatível com a função;

– Garantir que trabalhadoras gestantes sejam dispensadas do comparecimento ao local de trabalho, no caso de a função exercida não ser compatível com a modalidade home office, com remuneração assegurada durante todo o período em exita risco de contaminação no convívio social, podendo ser realizado o afastamento, desde que pautado em medidas alternativas, como: interrupção do contrato de trabalho; concessão de férias coletivas, integrais ou parciais; suspensão dos contratos de trabalho (lay off), suspensão do contrato de trabalho para fins de qualificação (art. 476-A da CLT), entre outras permitidas pela legislação vigente e aptas a garantir o distanciamento social, tendo em vista a condição de grupo de risco;

– Garantir às trabalhadoras gestantes que, na impossibilidade da execução das funções na modalidade a distância, seja adotado plano de contingenciamento, designando-as para outros setores de menor risco de contágio, com direito a rodízio de escalas de jornada e a horários de trabalho que permitam o deslocamento por transporte público fora dos horários de maior movimento, quando não seja garantido o transporte fretado;

– Aceitar o afastamento das gestantes conforme atestado médico que comprove a condição gravídica;

– Observar que a ausência de condições pessoais, familiares e arquitetônicas para realizar atividades em home office ou a existência de dificuldade de adaptação a essa modalidade de prestação de serviço não configuram hipótese de justa causa para a rescisão contratual.