Trabalho Noturno e em turnos
É bastante comum a pessoa ter dificuldades para adormecer, e para se manter dormindo, com isso reduzindo a duração do sono- particularmente o sono diurno. As pessoas também podem sentir bastante sonolência noturna, com dificuldades em manter a concentração, em se lembrar de fatos recentes, etc. Há muitos estudos mostrando que os riscos de sofrer ou causar acidentes de trabalho aumenta com o trabalho noturno, particularmente, se a jornada de trabalho é prolongada. Pesquisas mais recentes mostram que há aumento do risco de desenvolver diabetes, há associações entre câncer de mama e câncer cólon-retal com o tempo de trabalho em turnos, particularmente o noturno.
No caso dos seres humanos, estes ritmos são endógenos, internos, e auto-sustentados por grupos de células localizadas dentro de nosso cérebro- os centros do chamado “relógio biológico”. São interligados com várias regiões cerebrais e fora do cérebro – de forma harmônica anunciam ao nosso organismo como deve se comportar – se de dia ou à noite, quais e quanto de cada hormônio será secretado, quando as células de certos tecidos devem se dividir, qual a concentração de enzimas que deve haver naquele momento ou em outro para digerir os alimentos, a velocidade de transmissão de neurotransmissores, dos batimentos cardíacos, da pressão arterial, da viscosidade do sangue, etc.
Os ritmos internos são sincronizados por marcadores externos, presentes no meio ambiente, como a variação entre luz-escuro, do relógio que nos permite saber as horas do dia ou da noite, do momento em que ocorrem as atividades sócio-familiares, dos horários de trabalho, etc.Um ritmo infradiano bastante conhecido é o do ciclo menstrual, que tem um período aproximado de 28 a 30 dias.Um exemplo de ritmo ultradiano é o ritmo da sonolência – sentimos sono no meio do dia, e à noite.Nossa temperatura corporal tem um marcado ritmo circadiano – com aumento durante o dia e o máximo no final da tarde, e uma queda lenta, gradual, após as 18 – 19 horas, alcançando o mínimo no meio da madrugada.
Tornando a subir ao longo da manhã, e voltando a cair novamente no começo da noite. Há uma diferença de 1 grau a 1,5 graus entre o mínimo e o valor máximo diário do valor da nossa temperatura central. Se vocês pegarem o termômetro, e medirem a temperatura às 19 horas, provavelmente o valor será próximo a 37 graus.
Se continuarem medir a temperatura verão que começa a cair ao longo da madrugada. De manhã cedo já estará subindo novamente. Uma pessoa que dorme à noite e está ativa durante o dia, e cuja temperatura periférica, medida com um termômetro, marque 37 graus de manhã, provavelmente está doente. Mas, o mesmo valor no final da tarde, pode ser absolutamente normal. Há uma pequena queda da temperatura central ao redor das 11-14 horas, que também corresponde ao horário do almoço. Mesmo que não comamos nada, a temperatura vai cair, e por isto, sentimos sono neste período do dia. Aliás, fazer jejum aumenta a sonolência. De madrugada, a temperatura está mais baixa, e sentimos muito sono. Por isto também é difícil de ficar acordado durante a noite.Quando trabalhamos várias noites e dormimos durante o dia, a curva da temperatura altera-se – não sobe muito durante o dia, nem desce muito à noite.
Pelo fato da temperatura não diminuir durante o período de sono diurno, a pessoa vai ter dificuldade em cair no sono, e mantê-lo.Quando trabalhamos durante o período noturno ( seja em horário noturno fixo, ou em turnos alternantes), não dormimos no período que devemos sempre dormir, ou seja, durante a noite. Tomamos luz na hora errada – ou seja, no momento quando deveríamos estar no escuro, dormindo. Um importante hormônio marcador do dia e da noite para o nosso organismo é a melatonina.
Quando nossa retina recebe luz, e passa esta informação à glândula pineal, a melatonina deixa de ser produzida e enviada à corrente sanguínea. A melatonina é produzida à noite, quando estamos dormindo, e isto leva também a indução do sono.A melatonina tem sido utilizada para diminuir os efeitos do jet-lag para passageiros que atravessam muitos fusos horários.
Os esquemas de trabalho em turnos modernos são de poucas noites de trabalho consecutivas, seguidas de dias de folga para recuperação da fadiga e dos débitos de sono contraídos nos dias em que se trabalha à noite. Uma dica para sentir menos sono à noite, é ir tirar um cochilo algumas horas antes de ir trabalhar à noite. E acordar pouco antes da hora de ir para o trabalho. Quanto menos horas tiverem se passado entre o último sono, menos sono sentiremos.
Um cochilo no meio da madrugada, se for possível, faz muito bem à saúde, além de diminuir a sonolência noturna. Mesmo poucos minutos – por exemplo, 20 minutos de sono, é melhor do que nenhum sono.
Soube que no Japão há uma tradição de cochilos noturnos. Espero que estes possam ser tirados quando vocês trabalham à noite.
A parte sócio-familiar é muito importante, pois a família é o grande apoio do trabalhador em turnos fixos ou alternantes. A família deve ajudar a quem trabalha à noite, mantendo os ambientes tranqüilos, preparando refeições saudáveis ao trabalhador, permitindo que a pessoa possa descansar – e não ficar cuidando da casa ou das crianças, quando retorna cansado do trabalho. Quem tem problemas de saúde não deve começar a trabalhar à noite, pois estes problemas tendem a piorar. Assim, há várias condições de saúde que impossibilitam uma pessoa de trabalhar à noite. Alguns deles são: distúrbios gastrointestinais crônicos, dificuldades de manter o sono, epilepsia, doença do cólon irritável, etc.
Se precisar de mais informações, favor ler o livro: Trabalho em turnos e noturno na sociedade 24 horas. Fischer, Frida M, Moreno CRC, Rotenberg L, organizadoras.São Paulo, Editora Atheneu, 2003.
Há um exemplar na internet, gratuito, com publicações sobre trabalho em turnos e noturno. É na Revista de Saúde Pública, volume 38, 2004, suplemento. Os artigos estão em inglês.
Pela internet faz-se o download gratuito deste número: www.fsp.usp.br/rsp
Recentemente, foi publicado num periódico japonês, Industrial Health, uma série de trabalhos científicos sobre trabalho em turnos, particularmente sono. O download também é gratuito:
Industrial Health sleep issue (Vol. 43, No. 1). Veja: http://www.niih.go.jp/en/indu_hel/2005/index.html